quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Sheng nu ou o estigma das mulheres solteiras

Klaudia Lech terminava o curso de Fotojornalismo na Noruega quando se deparou com o termo "sheng nu", que em inglês significa "leftover women" (algo como mulheres "encalhadas", que não encontram marido), enquanto fazia uma investigação sobre os direitos das mulheres para o seu trabalho final. “Como mulher, fiquei um pouco ofendida e zangada por existir um termo tão feio para mulheres tão bonitas e na flor da idade”, conta Lech, norueguesa de 25 anos, em resposta por email ao PÚBLICO. “Comecei a pensar como é que estas mulheres se sentiam com um termo destes e entrei em contacto com alguns sites de encontros online chineses e ingleses.” Após a sua primeira viagem à China, Klaudia recebeu uma bolsa da revista chinesa Lens Magazine para continuar a documentar as histórias das mulheres sheng nu.
Chen Xin, com 32 anos, é investigadora numa organização não governamental em Pequim. Tem um bom ordenado, viaja várias vezes por ano e mantém uma vida social activa. Das raras vezes que visita a família em Quzhou, é criticada por ser solteira com aquela idade e pressionada para arranjar um marido. “A minha mãe diz que tem vergonha de olhar para os vizinho,s se eu não me casar rapidamente”, conta Chen. “Os meus pais vivem num mundo totalmente diferente do meu." Zhu Meiting, apresentadora de televisão com 34 anos, não quer um marido que tenha menos sucesso do que ela. Sabrina Wei, empresária de 36 anos, só sai com homens estrangeiros que não a julguem pela sua idade. Zhu Meiting, professora de Inglês de 29 anos, confessa que às vezes mente à sua família quanto à sua vida amorosa para que deixem de lhe arranjar encontros com desconhecidos. De uma forma geral, as mulheres chinesas na casa dos trinta anos sentem-se independentes e têm uma vida preenchida, mas são também fortemente pressionadas pela sociedade e família. “Não conheci ninguém que se sentisse uma 'encalhada'”, conta Klaudia. “Mas senti que infelizmente muitas tinham medo de se tornar uma aos olhos dos outros. Muitas mulheres que contactei não quiseram fazer parte do projecto e disseram-me: ‘Tens noção de que essa palavra é muito ofensiva na China, boa sorte para encontrar alguém que queira participar.’” Uma mulher que Klaudia Lech já tinha fotografado acabou por ficar com receio e pedir para não publicar as imagens, com o argumento de que não seria bom para a sua carreira. A repórter desanimou ao perceber que as mulheres não estavam a falar por si próprias e pareciam conformar-se com o termo, mas não desistiu.
Na sua viagem à China, encontrou mulheres para quem o termo sheng nu não era desprestigiante mas sinónimo de “vitória”. Anastasia Yang, de 30 anos, diz não ter inveja das amigas casadas. "Elas queixam-se tanto como eu. Se fossem felizes, talvez as ouvisse mais quando me aconselham a casar-me.” “Não quero ter a vida delas", confessa Anastasia. Klaudia Lech passou algum tempo com as várias mulheres que mostraram valorizavar a sua independência, chegando a dormir nas suas casas. O grau de intimidade era tal que uma delas até permitiu que Klaudia a fotografasse enquanto tomava um duche. “A minha impressão é que as mulheres solteiras na China têm de lutar pelo direito de esperar pela pessoa certa”, conta Klaudia. “Na China, não se fala de amor mas de responsabilidade.” As mulheres sheng nu começam a perceber que não precisam de um homem para tomar conta delas, como a sociedade impõe. Contudo, há quem não consiga resistir à pressão da família. Uma mulher de 29 anos, produtora num grande festival de cinema na China, contou a Klaudia que só aceitou uma nova proposta de trabalho para um cargo superior, após prometer aos pais que iria arranjar um marido no prazo de um ano. Os pais não achavam bem que uma rapariga solteira corresse algum risco na carreira profissional e a filha sentia que estava em dívida para com os pais. “Eu tenho de retribuir tudo o que fizeram por mim.” Todos os fins-de-semana, centenas de pais reúnem-se no People's Park em Xangai e colocam anúncios à procura de pessoas para se casarem com os seus filhos. A China tem mais 20 milhões de homens solteiros com idades inferiores a 30 anos do que mulheres. Contudo, nas cidades existem mais mulheres do que homens à procura de uma pessoa para se casarem. “De alguma forma, as mulheres são um interesse particular que acredito ser também a direcção do meu trabalho fotográfico”, conta Klaudia. “Se não fizesse fotografia, provavelmente criava um blogue de encontros online”, brinca. “O meu próximo projecto também é sobre mulheres.” (texto do PúblicoSIBILA LIND)

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